UNIDADE IV

1.      AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS NO  BRASIL

1.1    Contextualização Histórica –  Por Jorge Barcellos

A   partir  da  Revolução  de  1930  e  a  chegada  de  Getúlio  Vargas  ao  Poder  enquanto  revolucionário  e

 

representante das propostas de mudança da Nação Brasileira, o Estado torna-se o articulador central da política educacional brasileira. Após revolução que levou Vargas ao poder, até 937 permaneceu a tradição de relegar o ensino elementar aos Estados e Municípios. Quanto ao ensino secundário, a política educacional assumia competência exclusiva. Em 1931, Francisco Campos, então Ministro da Educação e Saúde, propõe a Reforma do Ensino Secundário, ampliando o monopólio estatal do acesso ao ensino superior. Tratava-se da política de "equiparação", política de oficialização de escolas públicas e privadas que exigia a equivalência de todos os cursos com o Colégio Pedro II. Foi o primeiro referencial normativo para o setor da educação secundária, levando as ultimas consequências a normatividade que já vinha se realizando ao longo da república.

São reformas superiores as previstas para a educação pela Aliança Liberal. Francisco Campos era ex-Secretário da Instrução Pública de Minas Gerais. A reforma incluiu ainda o ensino profissional e a formação específica de magistério. Quanto ao terceiro grau, Francisco Campos criou novas áreas de saber universitário, mas assumindo um compromisso com a educação secundária. Ele estabelece a implementação definitiva do sistema seriado, o estabelecimento da política de equiparação das escolas e a criação de um sistema federal de regulamentação, fiscalização e orientação pedagógica das escolas equiparadas. A importância da ênfase adotada está no fato de que desde 1891, com Benjamin Constant, o ensino secundário era um mero preparativo para o ensino superior. O ensino seriado dá uma finalidade própria ao ensino secundário. A respeito, assinala Marlos Bessa Mendes da Rocha, em "Educação Conformada: a política pública de educação (1930-1945)

"Com a reforma Campos, ao contrário, o conteúdo da crítica pedagógica exercida e as medidas administrativas tomadas justificam-se inteiramente como voltadas para o ensino secundário. Nesse sentido, aboliu-se em definitivo os "exames de preparatório", mecanismo utilizado pela União nas reformas anteriores (exceto pela Reforma Rivadávia, de 1915) no controle do acesso ao 3o. grau. Exigir-se-á, a partir de então, que o acesso ao superior somente se faça pelo cumprimento, por completo, do sistema seriado. A preparação às Faculdades não será, entretanto, a sua única finalidade, pois o que se quer é que a seriação forme a personalidade do aluno, além de sua habilitação geral para a escolha profissional"

A Reforma Rivadávia havia vigorado de 1911 a 1915, formulada pela Lei Orgânica do Ensino Superior e Fundamental da República. Elaborada pelo Ministro Rivadávia Correia, aboliu por completo qualquer interferência da União sobre os estabelecimentos de ensino e sobre os exames de acesso, como assinala Marlos Rocha. A reforma de 1931, ao contrário, se faz com o comprometimento da União com a rede de escolas secundárias, através de mecanismos de fiscalização das escolas oficiais e particulares. Somente são preservados os exames preparatórios da época do Império. Passam a existir então os "Exames de madureza", exames preparatórios para o ensino superior que conferiam o grau de Bacharel em Ciências e letras. Realizado em várias seções disciplinas, segundo Mattos é bem mais rigoroso que os exames preparatórios que conferiam apenas certificados de estudos secundários. Também foi o momento em que ocorreu a equiparação das escolas estaduais ao Ginásio Nacional. Aos poucos,o Estado alarga suas atribuições em matéria de ensino, inaugurando um processo de uniformização pedagógica, do ensino privado, que havia expandido-se e organizado no Brasil.

A mudança que a implementação da seriação também foi importante por que superou a possibilidade de se prestar exames para qualquer série. Ainda que permaneçam limitados a criação e manutenção de estabelecimentos públicos, a união interfere pedagogicamente no ensino secundário publico e privado, tornando homogêneos os currículos. Este quadro não é modificado pela Constituição de 1934, e durante o Governo Provisório, Francisco Campos buscará pela educação, atrair setores católicos, com a introdução do ensino religioso nas escolas públicas. Pode-se ter uma ideia do significado da medida frente ao caráter laico da tradição republicana, reforçado pelo Escolanovismo, movimento de renovação dos ideais educacionais que chega ao Brasil à época.

1.2  As  políticas  educacionais na década  de  1930

Em 1924, havia sido criada a Associação Brasileira de Educação. Em 1931, sua IV Conferência revela que o governo não conseguiu produzir um consenso entre os educadores nacionais. O governo provisório não possui uma política de educação, e as disputas acirram-se entre laicos e religiosos.. NO ano seguinte, em março de 1931, será lançado o "Manifesto dos Pioneiros", cuja ampla repercussão terá repercussão na Constituinte. Ele tem a formulação das "bases e diretrizes" para a educação nacional, com o objetivo de superar o estado fragmentário das antigas reformas, influenciando principalmente a escola pública. Segundo Rocha, "pretende-se superar o isolamento da escola em relação ao meio social, fazendo-a transbordar dos seus muros, levando-a a articular-se com outras instituições sociais”. Diz Shiroma

"Apresentava ideias consensuais como a proposta de um programa de reconstrução educacional em âmbito nacional e o principio da escola pública, leiga, obrigatória e gratuita e do ensino comum para os dois sexos (co-educação)

A proposta reconhece o relativismo da educação, defende uma concepção de vida e mundo, que são também marcadas pela origem de classe social. A educação tem agora uma consciência histórica, afastando-se dos interesses de classe social, dos privilegiados, para ser a base para a organização da sociedade. Nasce a ideia de uma escola de qualidade, guiada pelo principio de igualdade e acesso a todos os indivíduos. O Manifesto também defende um ideal humano, solidário, cooperativo, baseado em atividades criativas na produção. Compromete-se também com o respeito a individualidade humana. O individuo tem portanto direito a educação, função pública por excelência.

Nasce a ideia de escola única, escola comum para todos, acessível em todos os seus graus para todos os cidadãos. Deve ser uma função única, onde suas partes apresentam-se integradas. Precisa ser autônoma o suficiente para não depender em suas funções dos diversos governos, e os bens oriundos da sua organização devem pertencer aos próprios sujeitos (descentralização). Uma escola adaptada as necessidades dos alunos, reorganizada de forma dinâmica em contato com a comunidade. Para os pioneiros, somente um "Plano de Reconstrução Nacional", é capaz de possibilitar a construção de uma educação unitária, da escola primária a universidade. Como aponta Rocha "para os pioneiros, a educação é fonte de energia criadora, de solidariedade social e de cooperação". Os educadores, portanto, situam-se politicamente fazendo a critica da escola tradicional, trazendo dois princípios modernos: o da universalidade do acesso educacional e o principio da individualização pedagógica. Seu significado foi importante (1932-1937), no período que antecede a imposição do regime autoritário que se seguirá, pois, frente a um estado que se faz interventor social, reconhece o principio liberal de preservar autonomia da individualidade.

O ideário reformista superestimava a importância da reforma da educação para reforma da sociedade. Típico do espírito salvacionista, origina-se quando em 1930 foi criado o Ministério dos Negócios da Educação e Saúde Pública pelo Governo Provisório. O objetivo é criar a educação necessária a modernização do pais. Eneida Shiroma, em Política Educacional, assinala uma série de Decretos que efetivou as chamadas Reformas Francisco Campos. Em 11 de abril de 1931, é criado o Conselho Nacional de Educação e organizado o ensino superior no Brasil, adotando-se o regime universitário. Em 18 de abril de 1931, o Decreto 19.890, dispõe sobre a organização do ensino secundário e ao final de junho do mesmo ano, o Decreto 20.158, organiza o ensino comercial. A reforma Francisco Campos tutela o ensino nacional.

Entre os sujeitos com os quais o governo entrará em atrito, encontra-se a igreja. Conforme Shiroma:

"Para a Igreja, a educação moral do povo brasileiro deveria ser de sua exclusiva competência. Tratava-se, para os católicos, de um esforço político, patriota, uma vez que colaborando para a pureza dos costumes, estaria formando homens úteis e conscientes, com os conhecimentos necessários aos bons cidadãos"

O esforço valeu a pena. Em 1931, dentre as medidas assinaladas, o Governo Provisório inclui o ensino de religião nas escolas do país. É facultativo. Somente, após, com o Manifesto dos Pioneiros, a igreja verá seu poder ser afetado por setores intelectuais e educadores que emergem de um processo de industrialização. Entre as razões com que fazem o sucesso dos pioneiros, está o fato de que cada vez mais, são seus ideólogos que ocuparam cargos na burocracia estatal, atuando politicamente. Vargas e Francisco Campos agiram buscando conciliar as divergências.

A Constituinte de 1934 atribuiu ao Conselho Nacional de Educação a tarefa de elaborar o Plano Nacional de Educação. A proposta dura pouco. A repressão generalizada da ditadura varguistas faz com que os ideais liberais sejam combatidos. Para Rocha, é difícil estabelecer as regras e as especificidades do debate de 33-34, pois os posicionamentos, em geral, são carentes de visão de conjunto ou as vezes, até incoerentes. A Constituinte, por exemplo, discute a questão da participação da União nos diversos ramos e níveis de ensino, que do anteprojeto governamental, sofre um Substitutivo na Comissão Constitucional. A critica paulista, principalmente, era de que era um projeto centralista para a educação, permitindo a interferência da União em toda as esferas de ensino. Rio Grande do Sul e Minas Gerais, ao contrario, se posicionam junto ao governo: o ensino secundário, por exemplo, deve continuar submisso ao governo central.

A Constituinte também discute o tema do direito à educação. Primeiro, sobre o aspecto da afirmação jurídica do direito do cidadão. Em segundo lugar, pela previsão de recursos para a garantia desse direito e, finalmente, o da obrigatoriedade escolar, que define, de quem é o dever público. Nasce a ideia da educação como "direito público subjetivo" um avanço, se considerarmos o fato de que Rocha menciona que o anteprojeto governamental nada falava – exceto em "favorecer o desenvolvimento das artes, ciência e ensino" o Substitutivo Constitucional, somente dizia que "a todos facilitará o Estado a educação necessária" Ou ainda, cabe ao Estado a obrigação de dar os meios, e ao cidadão, a obrigação de reclamar os meios. Assinala Rocha

"Apesar dos renovadores conseguirem finalmente afirmar na Constituição o direito a educação, ele sai suficientemente mutilado para que nada obrigue o Estado a um investimento maciço em educação pública. Ao contrário de toda e expectativa dos renovadores, o que ali se abriu foi uma imensa brecha para o que Anísio Teixeira chamará mais tarde de "publicização do privado’ referindo-se ao processo de elevação do interesse privado ao plano do interesse público".

A constituinte põem também em debate a questão da ação supletiva da união. OS renovadores queriam que a União agisse em prol da educação onde se fizesse necessário, inclusive e principalmente, naquelas regiões carentes de recursos. Inspirados na experiência americana, os renovadores propõe a ideia dos Conselhos de Educação, como forma de realizar essa ação. Autônomos, segundo justificativa da ABE na sugestão para um Plano Nacional de Educação, "é preciso não esquecer a consideração muito importantemente de que, num e noutro caso, os órgãos políticos são sujeitos a mudanças demasiados frequentes.

A constituinte também propõe tratar da aplicação dos recursos públicos em educação, de forma a garantir a obrigatoriedade escolar básica. As constituições anteriores haviam se eximido desta questão, e agora, o debate se faz em índices orçamentários para a União, Estados e Municípios referidos a educação. Discute-se critérios para distribuição desses meios, inclusive, bolsas de estudos em instituições privadas, caso o sistema público não tenha condições. Isso fazia parte do reconhecimento da educação como direito social. Os renovadores, portanto, não tem, ao contrário do que se poderia pensar, comprometimento com a ideia de dirigir verba pública para a educação pública. Rocha, encontra a explicação em Anísio Teixeira, quando diz:

 “Antes de 1930, os colégios particulares do Brasil eram realmente particulares e resistiam vivamente a qualquer intromissão do Estado. Os de nível secundário pensariam em tudo, menos em pedir recursos ao Estado. Zelavam, sobremodo, pela sua independência e serviam a uma pequena classe média relativamente abastada e a pobres orgulhosos, que sofriam sua pobreza mas não desejavam esmolas, que tanto seriam consideradas as bolsas e auxílios"

Por isso é que não ocorreu uma grande disputa pela verba pública, inclusive, pelos setores majoritários da igreja católica.. Mas há a brecha constitucional para que ela se instale e ao longo do tempo, o principio de subimento público será a regra de financiamento do aluno carente no sistema privado. Seu auge se dará no Estado Novo.

A relação entre católicos e conservadores não era de oposição. De fato, assumiram posições conciliativas quanto a aprovação do ensino religioso de caráter facultativo nas escolas publicas, de acordo com a confissão religiosa, bem como a questão da intervenção do Estado na educação, a que a igreja era favorável, apesar de ser uma posição moderna. Sua exigência era apenas da participação da família na educação. Apesar de ser criada no meio de posições majoritariamente conservadoras (São Paulo, Minas e Rio Grande do Sul) a Constituinte abre espaços para o moderno representado pelos pioneiros, devido ao novo momento que vive o país após a Revolução de 1930. Além disso, os pioneiros tiveram sucesso em demonstrar a coesão de seus princípios doutrinários e de forjar alianças entre educadores e políticos. Foram eles que qualificaram a definição de quem educa e de quem diz o como educar. Para a primeira, a resposta é a centralizada do poder público em todos os níveis e ramos de ensino, aprovada a nível de diretrizes de autoridade e fiscalização. Os pioneiros tinham consciência da necessidade de modernização do Estado. Os limites eram dados pelo contexto da época. NO Caso dos Conselhos de Educação, como órgãos públicos de regulamentação e ensino, cede, num contexto centralizador, sendo aprovado um Conselho restrito, extinguindo o agente civil democratizador, o estado centraliza e termina por restringir o publico ao governo, e com ele, o controle da escola particular, em equivalência com as escolas públicas. Para Rocha

"São dois, portanto, os sentidos básicos do arreglo jurídico-político constituído naquela legislatura: 1. Afirmação de uma modernidade educacional pelo primado do púbico, mas que se faz fundamentalmente pela exacerbação da regulação e fiscalização do Estado, antes que pelo papel de promovedor da universalização do acesso por meios públicos; 2. Ambiguidade na definição do direito público a educação, igualizando direitos aos sistemas públicos e privados de ensino"

A Constituição foi promulgada em julho de 1934 e a repressão faria letra morta as propostas liberais e as garantias constitucionais em nome a ‘perseguir’ ao comunista. O atendimento manteve-se deficitário, ainda que tenham aumentado o número de matriculas. Havia uma distancia entre a intenção de saneamento escolar.

A implantação do Estado Novo em 1937, redefiniu o papel da educação no projeto nacionalista. A nova constituição dedicou-lhe menos espaço, garantindo-lhe apenas como estratégia de resolver a "questão social" e combater o comunismo. O estado privilegiava um ensino específico para as classes menos favorecidas, primeiro dever do estado a ser cumprido com industrias e sindicatos. A escola se transformava em lugar de discriminação social. A política educacional era o lugar da ordenação moral e civil, adestramento, obediência, formação da fora de trabalho para a modernização.

1.2    As  políticas  educacionais  do Estado Novo

A  política educacional do  Estado  Novo no ensino  básico, segundo  Rocha, não é  puro  arbítrio  do regime.

 

Ele herda o fundamento político estabelecido pela dimensão do direito publico de educação. Estão presentes, de uma forma desfigurada o, os sujeitos sociais civis no interior do estado. A preocupação é com a modernidade, e para isso, uma preocupação muito grande com o ensino primário, através de rede de escolarização e aportes financeiros, com critérios para sua distribuição, serão pensados. O Estado centraliza, regula e fiscaliza: seu conservadorismo revela-se na relutância da união numa aplicação intensa de verbas: o discurso de nacionalização é intenso, mas a participação é irrisória.

Entre a Constituinte de 1934 a instalação do Estado Novo, a ação da política dos renovadores foi organizada pela ABE. A constituição havia aprovado princípios caros aos renovadores, mas no espaço de luta, outros princípios foram desvirtuados, fazendo-se uma defesa das prerrogativas da União no ensino secundário, por exemplo. Em meados de 1935, com a promulgação da Lei de Segurança Nacional, inicia o fechamento político, e com esse a repressão deste ano. O movimento renovador é atingido e Anísio Teixeira, um dos principiais lideres renovadores e Secretario de Instrução Publica no Distrito Federal, demitido. O debate é cerceado

Em 1942, o então ministro Gustavo Capanema, implementou uma série de medidas que tomaram o nome de Leis Orgânicas do Ensino, que flexibilizaram e ampliaram as reformas Francisco Campos. Foram aprovadas a Lei Orgânica do Ensino Industrial(1942), a Lei Orgânica do Ensino Secundário(1942) o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial SENAI (1942), a Lei Orgânica do Ensino Comercial (1943), a Lei Orgânica do Ensino Primário e Normal (1946) e a Lei Orgânica do Ensino Agrícola (1946). Essa legislação completa o processo político dado pela criação do ministério dos Negócios da Educação e Saúde Pública e possibilitaram a consolidação de diretrizes em todos os níveis. As reformas de Campos, só atentaram para o ensino comercial. Contemplando todos os níveis de ensino, entretanto, havia dualismos que fazia com que não houvesse diretrizes comuns gerais a todos os ramos e níveis de ensino, as camadas mais favorecidas buscavam o ensino secundário e superior e as mais pobres, as escolas primárias e uma rápida formação para o trabalho. O SENAI foi um sistema paralelo ao oficial, o estado reconhecia sua incapacidade em prover a formação profissional em larga escala. Para os empresários, era o luar ideal para a formação dos valores do industrialismo e por isso foi mantido pelos fiados da Confederação Nacional da Indústria. Aos poucos, já em 1948, o SENAI desiste da tarefa que lhe é proposta, reivindicando para a escola primaria a tarefa de formação do operariado. É por isso que ao longo dos anos abandona os cursos e atividades vinculados a formação de mão de obra para dedicar-se a formação especializada de nível técnico. A remodelação sofrida no pós 64 devolverá ao Estado a tarefa.

Com a Constituição de 1946, do Estado Novo, é defendida a liberdade e educação dos brasileiros. Conforme Shiroma, "era assegurada como direito de todos e os poderes públicos foram obrigados a garantir, na forma da lei, educação em todos os níveis". Clemente Mariano nomeia uma comissão de especialistas com o objetivo de propor uma reforma geral da educação nacional, que em 1948 é apresentado ao Congresso Nacional e levará a promulgação, em 1961, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação nacional (Lei 4024/61). Segundo Shiroma, será a vitória das forças conservadoras e privatistas e que trará sérios prejuízos quanto a distribuição de recursos públicos e ampliação das oportunidades educacionais.

O ensino secundário durante o estado novo, contudo, foi diferente. Segundo Rocha

"Tratou-se de um ensino de cunho ideológico, valorativamente autoritário, centralista na sua formulação e controle, regulamentado estrito dos conteúdos e das regas de ensino, fiscalizador burocrático formalistas desses conteúdos e regras, homogeneizados do ensino em âmbito nacional nos níveis e tipos de ensino, segmentador dos cursos, dificultado equivalências e passagens de um curso a outro.”

Para Rocha, a questão de "como educar" e "quem educa" mantém-se sobre o estabelecimento de relações de tipo cartorial, beneficiando uma parte da iniciativa privada. A expansão da iniciativa privada na educação, nos anos 40, é fruto da política de equivalência entre ensino público e privado, que "trouxe ares de qualificação pública a um conjunto de novas escolas privadas’. A política de equivalência substitui a ausência de uma política de expansão da rede pública de ensino médio. A política para o ensino básico procurou comprometer verbas pública dos estados e municípios, já para o nível secundário não há preocupação com a expansão da rede. É conseqüência do fato de que o setor renovador não foi defensor do estatismo do como educar, mas da livre criação educacional sustentada com verba publica. Por outro lado, os que defendem a iniciativa privada não tem contradições com o controle estatal, , e de fato, expandem-se quando o Estado o regula, dando-lhe equivalência e disputa de verba publica.

Entre as razões, está o fato da nova conjuntura política dos anos 40. O Governo Vargas busca mobilização social em apoio ao governo, consolidando em 1945, quando é editado o Ato Adicional no. 9,Uma portaria ministerial concede aumento de 25% para os professores da rede privada, ato inédito, para os profissionais sujeitos a CLT, através de portaria. Gustavo Capanema revelava o comprometimento de sua atuação com medidas de apoio popular. O patronato de ensino reage, buscando compensações e os alunos, o não repasse as mensalidades. Daí o financiamento indireto, através da suspensão de impostos e da concessão de empréstimos, que colaboram no déficit orçamentário a longo prazo.

Segundo Rocha:

"Abriu-se, dessa forma, a nível de educação média, especialmente a de tipo secundário, o processo que aqui chamamos de cartorização do ensino privado. Ele é decorrente das opções fundas do Estado corporativo-autoritário, aliadas que foram da preservação conservadora de uma política de investimento educacional do Estado, que fora apanágio dos anos anteriores a 1940"

Os anos 40 encerram-se com o surgimento de um novo sujeito civil na realidade educacional, o empresariado de ensino. Seu vinculo estatal esta marcado pela sua origem, no momento em que foi dada ao ensino privado a dimensão de ensino publico. A intervenção do estado na educação privada se dará pela possibilidade de financiamento e gestão escolar sob critérios públicos. Contudo, nos governos posteriores, desaparece a questão da gestão, permanecendo apenas o financiamento. ""Ou seja, o que vale para o financiamento, não vale para a intervenção, o que evidentemente é um reconhecimento de fato, a revelia da lei, do caráter empresarial de tais estabelecimentos", diz Rocha, p. 169.

Durante 13 anos, o Movimento em Defesa da Escola Pública, iniciado na USP, com nomes como Florestan Fernandes, Fernando Azevedo, Anísio Teixeira, Lourenço Filho, ocupam as discussões do projeto em tramitação no Congresso nacional. Em 1959 é inclusive divulgado novo manifesto assinado por 189 intelectuais, educadores, endereçado ao governo e ao povo. A nova geração discutia os aspectos sociais da educação e a defesa da escola pública. A aprovação da LDB de 1961, conservadora, revela a submissão a iniciativa privada, prevendo ajuda financeira de forma indiscriminada ao mercado e a igreja.

1.4  As  políticas  Educacionais  do Estado Militar

O contexto político é agitado pela guerra fria e pela efervescência cultural e política. Surgem os chamados movimentos de educação popular, que nos anos 60, serão realizados pelos Centros Populares de Culturas, (CPCs) da Une, que levavam peças políticas a portas de fabricas e sindicatos . Também surgem os movimentos de Cultura Popular em Pernambuco e Rio Grande do Norte, com programa de alfabetização de Paulo Freire. A igreja divide-se tem-se a emergência de forças progressistas. A alfabetização das massas tinha então o objetivo de colaborar na conscientização popular e aumentar o número de eleitores, por que o voto não era facultado aos analfabetos.

O tema foi exaustivamente estudado por José Wiillinton Germano, em "Estado Militar e Educação no Brasil"(1964-1985). Para Germano, o estado militar precisou da adesão de uma parte dos intelectuais, camadas médias e massas populares. A ambigüidade de seu discurso e prática é que enquanto apelava a democracia e a liberdade, a golpeava, enquanto declarava-se a favor da erradicação da miséria, colabora para aumentar os índices de pobreza pela concentração de renda. Nesse sentido, insere-se o discurso favorável a erradicação do analfabetismo e a expansão da educação escolar, proposto pelos militares, enquanto reprimiam severamente professores e diminuíam as verbas do Orçamento para a educação. A política educacional faz parte do contexto em que o Estado assume cunho ditatorial voltado para os interesses do capital. As reformas do ensino superior (1968) e ensino primário e médio (1971) são realizadas sem a participação da sociedade civil, com a intenção de desmobilizar os eventuais movimentos sociais. A política educacional se transforma em "estratégia de hegemonia", veiculo necessário para a obtenção do consenso. O Estado militar esbarra no limite de escassez de verbas para a educa’[cão publica, já que está empregando os recursos disponíveis para a acumulação do capital. Seu interesse pela educação se manifesta pela repressão aos professores e alunos indesejáveis ao regime, pelo controle político e ideológico do ensino, eliminando-se a critica. O regime tinha como princípios um anticomunismo exacerbado, antiintelectuais que levava a negação da razão e o terrorismo cultural.

Finalmente Germano, a política educacional do Regime Militar vai se pautar pela economia da educação de cunho liberal. É elaborada a "teoria do capital humano", subordinando diretamente educação a produção – é o êxtase da aplicação de princípios da economia à educação. O II Plano Setorial da Educação, Cultura e Desporto(1974-1979), é exemplo disso. Germano assinala que em síntese, foram os seguintes os eixos de sua política educacional:

" 1) Controle político e ideológico da educação escolar em todos os níveis. Tal controle, no entanto, não ocorre da forma linear, porém, é estabelecido conforme a correlação de forças existentes nas diferentes conjunturas históricas da época. Em decorrência, o Estado militar e ditatorial não consegue exercer o controle total e completo da educação. A perda de controle acontece, sobretudo, em conjunturas em que as forças oposicionistas conseguem ampliar o seu espaço de atuação política. Daí os elementos de "restauração" e de "renovação" contidos nas reformas educacionais; a passagem da centralização das decisões e do planejamento, com base no saber da tecnocracia, aos apelos "participacionistas" das classes subalternas. 2) Estabelecimento de uma relação direta e imediata, segundo a "teoria do capital humano" entre educação e produção capitalista e que aparece de forma mais evidente na reforma do ensino de 2o. grau, através da pretensa profissionalização .3) incentivo a pesquisa vinculada a acumulação de capital. 4) Descomprometimento com o financiamento da educação pública e gratuita, negando, na prática, o discurso de valorização da educação escolar e concorrendo decisivamente para a corrupção e privatização do ensino, transformando em negócio redondo e subsidiado pelo Estado. Dessa forma, o Regime delega e incentiva a participação do setor privado na expansão do sistema educacional e desqualifica a escola pública de 1o. e 2o. graus, sobretudo"

Boa parte das reformas de ensino militares foram balizadas por recomendações de agencias internacionais e relatórios vinculados aos estados unidos, como o Relatório Atcon e o Relatório Meira Mattos do Ministério da Educação Nacional. Incorporava-se compromissos da Carta de Punta Del Leste (1961) e do Plano Decenal da Educação da Aliança para o Progresso. Eram os acordos MEC-USAID que tinham nos intelectuais orgânicos do regime, como o Instituto de Pesquisas E Estudos Sociais e o Instituto Brasileiro de Ação Democrática, as bases de apoio para o regime. Suas reflexões serviram também para uma perspectiva economicista em educação, confirmada pelo Plano Decenal de 1967. O planejamento da educação torna-se coisa de economistas.

Em 1964, várias leis são aprovadas entre elas a regulação a participação estudantil e o salário educação. Dois anos depois, é suspensa as atividades da UNE e a representação estudantil nas universidades federais. Entre 1967 e 69, é organizado o funcionamento do ensino superior: reitores podem enquadram o movimento estudantil na legislação pertinente, organiza-se o funcionamento universitário e proíbe-se a manifestação política na universidade. No campo do ensino fundamental e médio, é criado o Mobral em 1967, Movimento Brasileiro de Alfabetização e as diretrizes e bases para o ensino de 1o. e 20 graus (Lei 5692/71) que será reformada pela Iei7044, em 1982. A Constituição de 1967 faz um retrocesso, não prevento percentuais mínimos a serem despendidos pelo poder publico. Segundo Shiroma, havia dois objetivos básicos do governo militar durante o milagre económico brasileiro:

"O primeiro era o de assegurar a ampliação da oferta do ensino fundamental para garantir a formação e qualificação mínimas a inserção e amplos setores das classes trabalhadoras em um processo produtivo ainda pouco exigente. O segundo, o de criar as condições para a formação de uma mão de obra qualificada para os escalões mais altos da administração pública e da industria e que viesse a favorecer o processo de importação tecnológica e de modernização que se pretendia para o país"

Formulada no auge do regime militar, a reforma do ensino superior visou conter as mobilizações estudantis e a resistência a ditadura existem nas universidades. De fato, lideranças estudantis , intelectuais haviam se engajado na luta armada contra a ditadura.. A ditadura visava restaurar a ordem e ambiguamente, nos termos de Germano, "emprego desmedido da repressão política mas, igualmente, da assimilação (desfigurada) de princípios avançados que haviam sido colocados por segmentos e experiências de caráter reformador". Por exemplo, a lei 5540/68 extingue a cátedra, introduz o regime de tempo integração e de dedicação exclusiva aos professores, cria a estrutura departamental , divide o curso de graduação em duas partes, básico e profissional, e cria o sistema de crédito por disciplina, a semestralidade e o vestibular. Mas contudo, é a lei que implementa a indissociabildade entre ensino, pesquisa e extensão e fortaleceu a pós-graduação Outro exemplo é a lei 569271, que introduz mudanças no ensino, sem colocar em disputa os defensores da escola pública e laica, e a igreja, como ocorreu em 1936 e 46 e 61. Foi ampliada a obrigatoriedade escolar para oito anos, com a fusão do primário e ginásio, eliminando-se o excludente exame de admissão ao ginásio, antiga reivindicação dos educadores atendida pela ditadura. Finalmente, a implantação do salário educação (Lei 4420/64), cumpriu o papel de fonte de recursos, numa época em que o governo gastou menos de 3% do orçamento com educação. Delineai-se uma escola ampla que necessitava investimentos, e o governo limita-se a formular projetos de gabinete e favorecer favores e dependências. A educação se transforma em negócio, empresas privadas envolvem-se cada vez mais com a educação, aproveitando incentivos e subsídios.

1.5 A política educacional da Nova República

No segundo período (1975-1985), com a crise económica e política, a política educacional proposta pelo governo busca a correção das desigualdades no plano do discurso, enquanto na pratica continuou os mecanismos de exclusão da escola. 60% da população é excluída da escola, condenada a viver em condições miseráveis devido a contração de renda consequência do projeto de construção do "Brasil potência'. A prioridade do estado é o mercado, a acumulação de capital e não a educação. Os raros projetos voltados para educação tinham vícios estruturais, e os recursos perdiam-se no meio da burocracia. Exemplos são os programas e ações para as populações mais pobres do norte. A questão social passas a substituir o discurso da segurança nacional. A educação passa a colaborar com o projeto desenvolvimentistas tecnocrático, atenuando as contradições do modelo económico. Programas como Pólo Nordeste, Edurrural, Programas de Ações Socioeducativas e Culturais para as Populações Carentes do Meio Urbano (PRODASEC, e do Meio RURAL(PRONASEC), além do programa de Educação Pré Escolar, no entender de Shiroma, constituem exemplos do modelo de gestão das coisas da educação, e que vai perdurar por até hoje: a pulverização de recursos no campo da Educação, perda de recursos nos entraves burocráticos, dificuldades impostas pelas muitas instancias administrativas. Para Shiroma, "poucos recursos alcançavam as necessitadas escolas das regiões ou localidades a que se dirigiam". O estilo centralizador de controle das fontes de financiamento, o clientelismo na distribuição dos recursos, o atendimento de prerrogativas do Banco Mundial.

Com a Anistia, e a atuação de diversas entidades, como a SBPC, forma-se um consenso sobre a necessidade de um novo projeto educacional, Organiza-se o Fórum de Secretários Estaduais de Educação, que via a se transformar no Conselho Nacional de Secretários de Educação (CONSED), cujo objetivo é a defesa da educação publica, através da participação dos estados na definição das políticas do MEC.

O primeiro governo civil depois do regime militar de 1964, escolhido por um Colégio Eleitoral denomina-se Nova República. Para Sofia Lerche Vieira, em "Política Educacional em Tempos de Transição". Para Vieira, os documentos do governo Sarney fazem um "amplo inventário dos históricos problemas da educação, mas tendem a oferecer poucas alternativas inovadoras a sua superação". Os documentos, assinala, pautam entre suas prioridades estratégias de flexibilidade, mobilização social e articulação com a sociedade com o objetivo de valorizar projetos de valorização do magistério de educação básica, ampliação de oportunidades de acesso a escola e assistência ao aluno carente. A ele veio somar-se as diretrizes tiradas no dia 18 de setembro de 1985, o chamado "Dia D da Educação", que discriminou uma série de preocupações governamentais, principalmente quanto ao aumento do número de escolas, de melhor qualidade e participação da comunidade. Com o PND da Nova República, estabelece

 

"o compromisso de oferecer escola pública a todas as crianças de 7 a 14 anos. É objetivo, ainda, garantir a permanência dos alunos na escola durante todo o período da educação fundamental. Ao final do plano, 25 milhões de crianças estarão sendo atendidas"

A prioridade é explicita a educação básica. Passado dois anos, o foco da política educacional se desloca do executivo para o legislativo, onde está sendo votada a nova Constituição. Dois anos depois, a Reunião de Jomtien, realizada na Tailândia, assinala que, educação para todos é, para crianças de 7 a 14 anos, ou portanto, não exatamente todos.

Segue-se Fernando Collor de Mello, para um mandato de cinco anos.Para Vieira, seu governo inaugura a fase da "educação espetáculo", propondo o Programa nacional de Alfabetização para a Cidadania - PNAC. Como os governos anteriores, firma a concepção de uma educação como eixo importante para o desenvolvimento, sem fazer na prática grandes avanças. Exceção é a aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente, que não nasce por movimento dos educadores, mas que tem, contudo, um capitulo sobre o direito a educação. Collor concebe projetos de grande visibilidade, como a construção de Ciacs, que unem educação e saúde. São projetos que não apresente uma proposta coerente com o novo papel da educação desejada no contexto neoliberal. Para Mello & Silva, citado por Vieira, o governo Collor seria marcado

 

"por ausência de centralidade da educação na agenda governamental - inteiramente tomada pela administração da economia de curto prazo; falta de um projeto educacional e por consequência organizada das ações e programas de governo; centralização de recursos, decisões associadas a um discurso cuja tónica, era contraditoriamente, a da descentralização e falta de prioridades claramente definidas"

O governo Itamar Franco introduzirá no cenário político Fernando Henrique Cardoso, responsável pela adoção do Plano Real, caracterizado pela contenção dos gastos públicos, aceleração da privatização que terá efeitos imediatos no campo do financiamento da educação. No Ministério da Educação, assume Murilo Hingel, que acreditava na universidade pública e preocupava-se com o professor e a educação das crianças. Grandes mobilizações surgem com os debates para a elaboração do Plano Decenal de Educação para todos(1993), que se desdobrará em planos educacionais de estados e municípios, e a realização da Conferencia Nacional de Educação para Todos, (1994). Abre-se o governo para ouvir a sociedade, somente. O resto continua a velha estrutura tradicional de planejamento governamental.

A grande novidade é que o MEC passa a prestar contas de suas ações. Seus relatórios apontam que o foco principal é o ensino fundamental, principalmente com o Programa nacional de Atenção Integral a criança e adolescente (PRONAICA), que junto com as ações de assistência ao estudante, que junto com a Fundação de Assistência ao Estudante, será central na nova estratégia. O governo afirma-se com compromissos com o Plano Decenal, a questão do magistério. Plano Decenal, menina dos olhos do governo Itamar, enfrentou os mesmos problemas de descontinuidade administrativa dos governos anteriores. Para Vieira

"Nos tempos de transição, a política educacional coloca todas as suas energias sobre o ensino fundamental. Trata-se de uma opção dura que a médio e longo prazos compromete o ingresso do país na direção da sociedade do conhecimentoVu peb menos, restringe esse ingresso aos loucos eleitos favoritos da fortuna"